Fabrício Lopez
A partir do discurso do artista, o trabalho pode parecer uma proposta utópica, que envolve uma gama de questões internas e externas ao domínio estético, tão grande, que dificilmente teria respaldo efetivo em uma sala de exposições, especialmente em nosso contexto atual. Sua gênese contempla itinerários marítimos e terrestres, utilização de espaços públicos na cidade natal do artista (Santos, SP), pesquisa de materiais específicos para a utilização incomum de uma técnica tradicional, registro fotográfico e escrito, explicitação dos meios utilizados para a feitura das obras – também com objetivos “didáticos”-, a criação de uma imagética que avente um patamar mítico de determinada região brasileira… Pois, o trabalho de Fabrício Lopez consiste na utilização de uma técnica normalmente associada à pequena escala – a xilogravura -, em dimensões que, mal-comparando, equiparam-se ao muralismo mexicano ou ao expressionismo abstrato estado-unidense. Contempla as condições complexas de sua gênese discursiva sem se paralisar pelo receio de que ela demande um suporte teórico que, antes de qualquer resultado, salvaguarde o artista da condição de um anônimo desses que “gastam” uma “potencialidade estética” nas ruas, grafitando e pintando idiossincrasias em lugares públicos, a partir de um material específico, de temas ora literais ora completamente esquizofrênicos. Diferentemente, esse “inconseqüente” é visto como a prova de que é possível se o idealismo se sustenta gradualmente, mesmo em meio a estímulos dispares, ambiciosos, quase megalomaníacos, mas pragmaticamente explorados. Dos aspectos mais simples e duais, aos mais intrincados. A matriz de madeira dura e o papel. O branco e preto, luz e sombra; a gravação “crua” e incisiva composta com uma cor “pura”. O gesto que encontra sua cristalização na precariedade do instrumento que grava um compensado quase impróprio aos requintes daquela técnica – parece incisivo, um tanto violento no delineamento de figuras, mas também espontâneo e despretensioso na composição de elementos abstratos, de um cromatismo evanescente. As massas abstratas convivendo com estruturas fotográficas e poucos escritos num jogo de presença incisiva e perda de referencialidade. A figura consumida pela massa “da natureza”, a materialidade franca das obras, sua qualidade visual lançando-as um patamar mítico que já não podemos negligenciar. Uma demonstração singela, contra a falência anunciada de toda uma cultura.